Mais do que 11 homens unidos pelo mesmo objetivo, a paixão pelo futebol estende-se para as casas, ruas, comunidades, cidades e países

Mas afinal, o que justifica tamanho fanatismo que não traz nenhum retorno material para quem está de fora? O fenômeno do futebol, sem dúvidas, já está enraizado na cultura brasileira há anos, e, a cada ano que passa, a raiz mais se consolida no núcleo da nossa sociedade.

A história do desenvolvimento do Brasil é marcada pelo árduo processo de colonização, além dos inúmeros conflitos e polarização política - que faz-se presente até os dias de hoje. No meio disso tudo, o futebol consegue contemplar os interesses de 75% da população brasileira (CNN, 2025). Diante disso, há quem diga que o futebol é o ópio do povo.

Tal afirmativa nada mais é do que uma análise incoerente e superficial da realidade. Quando se diz que o futebol é apenas cortina de fumaça para mascarar os conflitos que se instauram na sociedade brasileira, vários outros fatores extremamente positivos para o desenvolvimento social do Brasil são deixados em segundo plano. Na verdade, o futebol é político, cultural e pedagógico. 

O período final do século XIX, quando Charles Miller trouxe o futebol para o Brasil, ainda era marcado pelo racismo e elitismo, e a prática do esporte, a princípio, se restringia somente às classes altas. Contudo, a simplicidade do futebol foi um dos principais fatores responsáveis para democratizá-lo entre o povo, que só precisava de um terreno baldio e algum objeto redondo para chutar.

No ano de 1900, a Associação Atlética Ponte Preta foi fundada, e, contrariando os estigmas raciais que chegaram ao Brasil junto com o futebol, a equipe já havia em seu time o primeiro jogador negro de futebol no Brasil: Miguel do Carmo. Pouco tempo depois, em 1910, foi fundado o Sport Club Corinthians Paulista, outro time marcado pela força política de inclusão.

Foi em 1923 que o Clube de Regatas Vasco da Gama consagrou-se campeão do Campeonato Carioca com sua equipe majoritariamente composta por jogadores negros e periféricos. Este fato foi o principal marco contra as normas preconceituosas que vieram junto com o futebol. Um ano depois, o Vasco ainda reafirmou seu compromisso com a inclusão e igualdade social ao recusar-se a dispensar seus jogadores negros.

O futebol foi profissionalizado em 1930, e a força política de clubes como o Vasco da Gama foi imprescindível para derrubar as barreiras da discriminação racial e democratizar o esporte entre todos. Além disso, a popularização do futebol no contexto da ascensão radiofônica foi outro fator primordial para que esses atos políticos chegassem aos ouvidos do povo.

Em 1958, aos 17 anos, Pelé consagrou-se campeão da primeira Copa do Mundo e tornou-se um ícone de referência mundial. Pelé, que foi um jogador negro, era engajado em inúmeros movimentos políticos e sociais, e sua relevância e impacto dentro e fora de campo foram um grande pontapé para o avanço da luta contra a discriminação racial no Brasil.

Naquele contexto de vitória da primeira Copa do Mundo, o futebol instaurava-se no território nacional como um grande objeto cultural. A democratização das emissoras de rádio foram essenciais para esse fator. Enquanto a mídia impressa exigia que a população fosse alfabetizada para compreender os fatos narrados e a televisão restringia-se aos grupos sociais mais abastados, a rádio colocava-se como um dispositivo de acesso universal.

A informação instantânea e a capacidade que os locutores tinham de desenvolver narrativas imersivas lapidaram a força do rádio como o principal meio de comunicação daquele período. Além disso, as rádios eram reproduzidas em qualquer lugar e não era necessário ser alfabetizado para compreender a informação, ou seja, tanto crianças quanto adultos que não tiveram a oportunidade de aprender a ler poderiam se aventurar nas veiculações radiofônicas.

Cabe também ressaltar como ainda naquele período as rádios já reconheciam a importância cultural do futebol, e não deixavam de documentar uma partida sequer.

Com o advento do jogo do povo, o futebol consagrou-se como uma arte coletiva. As crianças viam a paixão de seus pais pelos times, e aí surge o sentimento de pertencimento e identificação com um clube. Mas, para além do fanatismo, o futebol é uma grande ferramenta pedagógica, que ensina o trabalho em equipe, honestidade e competitividade, preparando os jovens para a vida.

Afinal, o futebol nada mais é do que a pura representação da vida: você se encontra com aqueles que compartilham o mesmo sentimento que você, e juntos se norteiam para um mesmo objetivo.

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